quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Lítio apresenta efeito protetor contra doença de Alzheimer

Por Júlio Bernardes
Da Agência USP
Pesquisa do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina (FMUSP) da USP comprova o efeito protetor do lítio para prevenir o aparecimento da doença de Alzheimer. A ação protetora foi verificada em idosos com transtorno cognitivo leve, que têm maiores riscos de desenvolver a doença. O trabalho deverá ser publicado em uma das próximas edições da revista científica British Journal of Psychiatry.
Entre pacientes com transtorno cognitivo leve, cerca de 10% desenvolvem o Alzheimer, um ano após manifestarem sinais de perda de memória. “Um grupo de idosos recebeu uma dose diária de 300 miligramas de lítio, menor do que a utilizada em casos de transtorno bipolar, e outro um grupo controle que recebeu apenas um placebo”, conta o médico Wagner Gattaz, do IPq, que coordena a pesquisa junto com Orestes Forlenza, também do IPq. “Um ano depois, o percentual de pessoas que tomaram lítio e desenvolveram a doença era significativamente menor do que no grupo controle, o que demonstra um efeito protetor.”
A doença de Alzheimer é caracterizada por dois processos biológicos, o aumento da produção de betaamiloide, proteína que se deposita em placas no cérebro (placas senis) e a hiperfosforilação da proteína TAU, um processo que destrói o esqueleto das células. Ambos os processos levam a morte dos neurônios. “O lítio inibe a atividade da enzima GSK 3-Beta, que fosforila a TAU e também participa na produção de beta-mieloide. Portanto o litio seria, potencialmente, o antagonista ideal contra os dois processos”, destaca o médico.
De acordo com Gattaz, os tratamentos existentes apenas retardam a progressão da doença, sem impedir todavia a sua progressão. “Embora os sintomas da doença de Alzheimer, geralmente surjam após a sexta decada de vida, o processo biológico da perda de neurônios começa algumas decadas mais cedo”, observa. “Por isso há a necessidade de desenvolver uma medicação que possa prevenir precocemente o surgimento da a doença.”
Prevenção
Um novo projeto temático, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), realizará experimentos em animais geneticamente modificados para verificar se o lítio, ingerido em doses baixas durante toda a vida, pode prevenir o surgimento da doença de Alzheimer. “Esses animais possuem uma modificação genética que os leva a produzir o betaamilóide”, aponta Gattaz. “Eles receberão lítio desde o nascimento e serão acompanhados por toda a vida para saber se haverá o desenvolvimento da doença.”
O professor ressalta que se os testes com animais e os ensaios clínicos com seres humanos forem bem-sucedidos, seria possível usar o litio na prevenção da doença. “O Brasil é um dos maiores produtores de lítio do mundo”, afirma. “Talvez um dia possa ser possível prevenir a doença de Alzheimer com a ingestão diária de doses minimas de lítio durante toda a vida, por exemplo na água potável, da mesma forma que a adição de flúor na água diminui a incidência de cáries, ou a adição de iodo no sal de cozinha previne doenças da tireóide.”
O médico lembra que dois estudos antecederam os experimentos com os portadores de transtorno cognitivo leve. No primeiro, idosos com transtorno bipolar, doença em que o lítio é utilizado para estabilizar o humor, foram comparados com outros que não receberam a medicação. “Entre os pacientes que tomaram lítio, a incidência de Alzheimer foi cinco vezes menor do que entre os que não tomaram”, conta. O trabalho foi publicado em 2007 no British Journal of Psychiatry.
No estudo seguinte, foi investigado o mecanismo pelo qual o lítio diminui a atividade da GSK 3-Beta. “O mais provável é que o lítio inibe a expressão do gene da enzima”, diz o pesquisador do IPq. O trabalho é descrito em um artigo no European Archives of Psychiatry and Clinical Neuroscience, publicado em 2008.

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